quinta-feira, outubro 08, 2009

A VINDA DO CRISTO CÓSMICO
A Cura da Mãe Terra e o Surgimento de uma Renascença Planetária*
O Significado etimológico de religião é “religar-nos” as nossas origens. Crentes religiosos e todos os cidadãos de nosso planeta precisam ouvir o amplo e impressionante mistério da história científica de nossas origens. O arquétipo do Cristo Cósmico incentiva-nos a venerar nossas origens de maneira que seria impossível para o paradigma religioso antropocêntrico da era do Iluminismo. Encoraja-nos, também, a venerar nossa divindade e nossa responsabilidade como co-criadores de maneira impossível para o paradigma do Iluminismo. Conforme coloca Meister Eckhart, “conquanto sejamos filhos e filhas de Deus, ainda não nos demos conta disso.”

Este livro inicia-se com um sonho e termina com uma visão. Tive o sonho no dia 15 de março de 1986. Foi um sonho sobre a devastação que nosso planeta vem suportando devido à ausência de uma cosmologia viva. Chamo essa devastação de “matricídio”, ou extermínio da mãe, pois assim me foi dito no sonho.

(...) Os riscos a que estão expostos a Mãe Terra e nossos filhos não serão reduzidos sem a participação de nossa herança espiritual na batalha. “Combata os piores com os melhores”, aconselha o fazendeiro/poeta/profeta Wendell Berry. Na conferência da Academia Nacional de Ciências, em 1986, analisando a extinção em massa de plantas e animais em nosso planeta, Paul R. Ehrlich, da Universidade de Stanford, declarou: “A análise científica aponta, curiosamente, para a necessidade de uma transformação quase-religiosa das culturas contemporâneas”.
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(...) Não apenas na religião, mas todos os níveis de cultura precisam unir-se na luta, como mostra o escritor Harold Gilliam em sua palestra “Situação do Mundo”. Isto não se realizará sem um salto quântico na educação pública e na pressão pública sobre os líderes, para que estes ajam no sentido de preservar o habitat global. Este não é o tipo de entendimento que possa surgir em um computador. Ele só pode ser gerado pela mídia convencional – incluindo a imprensa, o púlpito, o rádio e a televisão – e pelas escolas, as quais, com poucas exceções, estão realizando o trabalho lamentável de dar aos nossos jovens a visão da atual degradação do único planeta que temos. Quando uma civilização não possui uma cosmologia, ela não é apenas cosmicamente violenta, mas cosmicamente solitária e deprimida. É possível que a verdadeira causa das drogas, do álcool e dos hábitos de entretenimento que assolam nossa sociedade não resida exatamente nos “reis das drogas” de outras sociedades, mas na solidão cósmica que persegue a nossa própria sociedade? Talvez o álcool seja uma cosmologia líquida e as drogas uma cosmologia rapidamente assimilável para pessoas desprovidas de uma verdadeira cosmologia. Observadora perspicaz da natureza humana de nossa época, a psiquiatra Alice Miller compreende o contrário da depressão não como júbilo, mas como vitalidade. Qual a nossa vitalidade nos dias de hoje? E qual a vitalidade de nossas instituições de culto, educação, política, economia? É possível que toda a nossa civilização esteja deprimida porque nos falta a perspectiva do Cristo Cósmico?

(...) A morte da Mãe Terra (matricídio) e a ressurreição da psique humana (misticismo) e o advento do Cristo Cósmico (uma cosmologia viva) designam o mistério do ciclo divino de morte, renascimento e envio do Espírito em nosso tempo. Se a raça humana voltasse a crer neste mistério, certamente ocorreria um renascimento.

(...) Os profetas e os eruditos da antiga Israel, juntamente com os profetas de outras religiões, incluindo os nativos da América, não desconhecem o Cristo Cósmico (ou Sabedoria Cósmica) que existe entre nós.

(...) De que maneira a devastação da terra chega ao fim? Através da metanóia, uma transformação no coração (...) Essa parte corresponde a esse despertar do conhecimento do coração e à entrada na escuridão que é chamada de misticismo. Com essa ruptura o dia de Javé – dia de compaixão e justiça, de cura e celebração – pode acontecer verdadeiramente.
“A prece é Atendida, O Deus Criador Envia o Espírito Santo para Curar.”

(...) O despertar místico que prenuncia uma cura global é apresentado como despertar cósmico, um despertar para uma cosmologia viva, pra um Cristo Cósmico vivo e vital em todas as criaturas e em todos os seres humanos – jovens e idosos, escravos e livres, homens e mulheres. O espírito messiânico é apresentado como não-elitista – ele será derramado sobre todos os tipos de pessoas
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(...) Prognostico um renascimento, “renascimento baseado em uma iniciativa espiritual”, para utilizar do historiador M.D. Chenu, como resultado do transbordamento do Espírito. Este novo nascimento penetrará todas as culturas e religiões e na verdade estimulará a sabedoria comum a todas as tradições místicas vivas e realizará um despertar religioso global a que chamarei de “ecumenismo profundo”.

(...) Neste livro invoco um novo Pentecostes, o advento do espírito messiânico para toda a raça humana e todas as suas religiões e culturas. Mas invoco também a penitência, uma autocrítica e abandono profundos e radicais entre meu próprio povo, isto é, entre os cristãos europeus e oriundos da Europa. Precisamos abandonar o Iluminismo e a sua visão de mundo, que renegam o misticismo e a que faltam uma cosmologia. Precisamos abandonar uma visão de mundo religiosa que aborrece os jovens, trivializa Jesus Cristo e torna nossa herança espiritual praticamente impotente. O cientista e místico Gregory Bateson observou que “perdemos a essência do Cristianismo”. Eu concordo, pois a essência deve ser uma cosmologia vital e viva, um misticismo cosmológico, um Cristo Cósmico. Nenhum livro escrito por mim abalou-me mais do que este, pois aprendi, durante o processo de sua criação, como nós, ocidentais, fomos ludibriados e excluídos durante uma era religiosa a que faltava uma cosmologia, perdendo todo contato com o Cristo Cósmico. Como demonstro na parte III, não é possível ler os Evangelhos corretamente sem uma cosmologia viva; no entanto, é isso que nossos teólogos e líderes espirituais têm feito ao longo dos séculos. Fazer penitência por este pecado de omissão por parte da religião significa que devemos abandonar o antigo paradigma e comprometermo-nos vigorosamente com esse paradigma mais novo, conquanto muito mais antigo. O que significa que a teologia do Cristo Cósmico – ignorada durante séculos – deve ser seriamente reconsiderada hoje.

A penitência por mim exigida não é simplesmente uma metanóia individual ou “transformação do coração.” O Espírito é Aquele que “torna todas as coisas novas” e a renovação que anseio ver é a renovação das próprias igrejas. Para que isto aconteça, as igrejas têm de confessar seus pecados, implorar o perdão, ser esvaziadas, abandonadas e começar mais uma vez com o paradigma novo mas muito antigo do Cristo Cósmico.

As igrejas precisam implorar o perdão dos povos nativos cuja noção do Cristo Cósmico jamais se perdeu; o perdão dos amantes que não foram informados do misticismo sexual celebrado pelo Cântico dos Cânticos; o perdão dos jovens que continuam a ser vítimas de adultismo em mãos de tantas instituições ocidentais, incluindo as religiosas; o perdão dos artistas e do ator criativo que existe em todo adulto; o perdão das mulheres e de outras pessoas lesadas em sua herança espiritual em uma era religiosa anticósmica e antimística. Uma vez que as igrejas se ajoelhem e peçam perdão, elas deverão se erguer rapidamente e começar a contribuir para o renascimento de que o planeta necessita tão desesperadamente. Elas deverão conduzir a adoração revitalizada e o compromisso revitalizado com o ecumenismo profundo, proveniente de uma moralidade de reverência por toda a criação, que por sua vez nasceu de um despertar místico para a admiração, assombro e “estupefação radical” (frase do rabino Abraham Heschel) ante nossa existência.

Wendell Berry afirma sensatamente: “Talvez o grande desastre da história humana seja aquele ocorrido à religião ou dentro dela, qual seja, a divisão conceitual entre o sagrado e o mundano, o afastamento do Criador e sua criação. O misticismo representa a cura para esse dualismo religioso, contudo, o misticismo tem sido ignorado pela maioria dos ensinamentos e líderes teológicos judaicos, católico-romanos e protestantes. Este livro procura oferecer uma maneira de curar o dualismo entre ciência e religião, alma e cosmos, psique e espírito, justiça e celebração, teologia e misticismo, Deus e nós.

Se minha tese de que é chegado o momento de passar a busca do Jesus histórico para a busca do Cristo Cósmico estiver correta, isto ajudaria a dissipar a religião distorcida e o movimento pseudo-místico de nossa época, popularmente conhecido como fundamentalismo e chamado às vezes de cristofacismo. Os teólogos do Iluminismo – também chamados de “liberais” – são incapazes de lidar com uma cosmologia, pois devem mais a Newton, Kant e Descartes do que aos autores dos Evangelhos do século I, os quais acreditavam em uma cosmologia viva e em um Cristo Cósmico. Um dos resultados é que o livro mais escatológico da Bíblia – O Livro da Revelação (Apocalipse de São João) – tem sido deixado para os fundamentalistas à direita e os marxistas seculares à esquerda. A confusão dos teólogos do Iluminismo no que se refere à questão da ressurreição e ao túmulo vazio deve-se à ausência da cosmologia. Neste livro reivindico a demolição da religião liberal e o restabelecimento da fé em uma visão de mundo cosmológica, profética e mística – uma transformação e renovação, não apenas uma correção ou reordenamento de uma agenda extenuada. O despertar religioso radical que mereça ser chamado de renascimento espiritual é aquele que critica tanto a psique (misticismo) quanto a sociedade (justiça e profecia). E que faz o que prega.
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O advento do Jesus histórico e do Cristo Cósmico afinal tornará o Cristianismo integral. O Cristianismo tem mantido inalcançável sua “essência”, seu centro, sua noção de prática mística e consciência cósmica. Ele sucumbiu a uma mentalidade patriarcal que tem corroído sua adoração, sua mensagem e sua identidade, tornando-as estagnadas e sem vida, quase tão extenuada e deprimida quanto nossa civilização. O Cristianismo precisa do tipo de sonhos e visões prometidos em abundância na era messiânica, pelo profeta Joel. Ele precisa do tipo de renovação com que João XXIII sonhava ao iniciar sua revolução no Vaticano, na década de 1960. Talvez um novo “concílio ecumênico” esteja por vir proximamente. Seria profundamente ecumênico e convocaria a sabedoria de todas as religiões do mundo.

(...) Que criatura ousaria rejeitar sua condição de diamante imortal? Uma bênção original? Uma imagem do Ente Divino? Sei, por experiência própria, que apenas a espécie humana se atreve a negar sua divindade, se atreve a negar o Cristo Cósmico. É chegado o momento, nas palavras de Meister Eckhart, de “negar a negação” (ME, 40). Se a própria religião não consegue mostrar o caminho nessa negação da negação do Cristo Cósmico, nessa ressureição, ascenção e envio do Espírito para a Mãe Terra por meio da ressureição da humanidade, neste caso estamos realmente com sérios problemas. Neste sentido, submeto abertamente este livro aos pensadores e líderes religiosos como julgamento não de ortodoxia, mas de ortopraxia. A que espécie de trabalho e ações conduz a convicção no Cristo Cósmico?

(...) O tempo está escoando rapidamente para a Mãe Terra e a madre igreja. Gregory Bateson coloca esta questão oportuna para a igreja e a sinagoga: “A raça humana está deteriorando a sua mente a partir de uma religião em lenta deterioração?” Creio que uma religião em lenta deterioração é aquela que ignora ou esquece suas próprias origens fudamentais; que subestima a capacidade humana para o mal – em nossa época, a capacidade de o homem destruir a Mãe Terra e seus filhos; que não consegue sanar os dualismos e, na verdade, os incentiva; que entedia os jovens; que aviva o fogo dos bodes expiatórios e estimula o pecado da projeção; que não pode admitir seus próprios fracassos e erros; que se sente impotente diante dos poderes e principados da sociedade; que não consegue celebrar e ensinar as pessoas a celebrar; que substitui a moralização pelo misticismo; que não possui uma cosmologia nem interesse pela cosmologia; que denigre os esforços da ciência para adquirir conhecimentos sobre a criação; que ignora o artista; que comete adultismo, sexismo ou antropocentrismo; que condena seus próprios profetas; que aliena os anawin, sejam eles mulheres, homossexuais, pobres ou iletrados; que diminui o culto às palavras; que não oferece perspectivas a uma sociedade exausta; que não consegue estimular a criança nos adultos e jovens; que não consegue desafiar o confortável. Se Jung está correto quando afirma que “apenas os místicos levam a criatividade para a religião, a única maneira de a religião resistir à decomposição consiste em abrir mais uma vez seu coração e suas concepções teológicas para o místico.

Que o Cristo Cósmico possa redimir-nos de uma religião desprovida de misticismo e insensata. Que o Cristo Cósmico possa conduzir-nos para um século mais saudável – e menos racional. Que o Cristo Cósmico abençoe a todos nós, para que possamos abençoar e não crucificar a Mãe Terra e as gerações vindouras.
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* Para mim foi um (re)"encontro místico de almas e ideais", pois, inconscientemente já vinha compartilhando algumas idéias que muito se afinizam com alguns princípios de Fox. Uma "espiritualidade mais ecológica", um "re-ligare" mais profundo, místico, direto e mais real. Um propósito mais Xamânico e verdadeiramente cristão, entendo eu. Trago a todos os "irmãos em caminhada" a transcrição de algumas partes do primeiro capítulo deste precioso livro de Matthew Fox, que é Padre da Igreja Anglicana, conviveu e muito aprendeu com os nativos indígenas. Vejam em seus agradecimentos no livro: "Uma nota de apreço também para os dançarinos do Sundance [tradicional e sagrada dança-ritual indígena norte-americana], em Rosebud Reservation, agosto de 1987, cujos ordálios fazem deste planeta um lugar mais sagrado para todos nós. (Comentários por Hugo Acauã)

Matthew Fox, A Vinda do Cristo Cósmico – A Cura da Mãe Terra e o Surgimento de uma Renascença Planetária. Record: Nova Era.

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